KAAPORÃ
ARTISTAS
ABI POTY
ANABYA
DJATSY MOTARA
JULIA DUARTE
XIPU PURI
PROJETO EXPOSITIVO
ABI POTY & XIPU PURI
EDIÇÃO DE TEXTOS
XIPU PURI
EXPOGRAFIA
ABI POTY
PRODUÇÃO EXECUTIVA
JULIA DUARTE
REALIZAÇÃO
PRODUTORA MIRIPONAN
APOIO
CENTRO CULTURAL DA DIVERSIDADE
O culto aos ancestrais é algo central para muitas culturas, estando no fundamento do pertencimento a seus respectivos territórios. Abi Poty, ao trabalhar com as sementes de lágrimas (Coix lacryma-jobi L.) amplamente utilizadas entre etnias pindorâmicas para a produção de artesanatos e artefatos para proteção espiritual, traz em sua obra uma concepção de existência e de tempo contida na relação entre antepassado e descendente. AIKO IKÉ! é perpassada pela compreensão que os antigos se mantém vivos, sua consciência resiste ao corpo e sua força encantada norteia os seus nessa dimensão outrora habitada por outras muitas gerações. A obra de Xipu Puri traz a simplicidade que perpassa a consciência de uma pessoa que cresceu no interior do Brasil, no coração do território de seu Povo e demarca sua inscrição no mundo enquanto pertencente à etnia Puri. Ñawera, o Encantado Puri, guardião das florestas, entronizado pelo neto do Seu Zé Passarinho, se alude a uma espiritualidade e uma episteme indígena que resiste e tem se confirmado como o caminho para a constituição de novos ou reconstrução de antigas e orgânicas formas humanas de inscrição no mundo, em meio ao caos socioambiental assentado nos últimos séculos. Os Baobás de Julia Duarte, como o recorte de um sonho, representa o pertencimento a um chão um tanto distante, mas ancestral, coetâneo, presente, onde a memória de milhões de brasileiros encontra sua origem, marcada por um abismo traumático de onde também foi parido o Brasil. A visão da artista reproduz a força das antigas nações de África, a sabedoria milenar, o àṣẹ, que acompanhou cada vida que carregava em si corpo e território, na dura travessia do oceano. A obra de Djatsy Motara reúne traços e elementos oriundos da espiritualidade e da cultura Guarani, com padrões que remetem a grafismos, produzindo um efeito psicodélico de distorção e pulsão da realidade. Anabya, em Kanoas Flutuantes, traz a memória de um mergulho no rio, em uma imersão no tempo profundo da infância. Sua poesia narra as dimensões que compõem a vida, os encontros, a relatividade do tempo e a densidade dos sentidos que fazem de nosso “pequeno ancestral” um grande rio de onde mina o sugo de nosso espírito humano por toda a vida. Por meio de sua obra, a artista nos incita a ser curumim, a ser rio, canoa, a ser tempo e a ser mãe.
AIKÓ IKÉ! (ESTOU AQUI!)
Abi Poty, 1994
Sementes de lágrimas bordadas sob tecido de algodão cru e urukum. 16x22 cm. 2023.
ENCANTADO PURI
Xipu Puri, 1997
Fibras de jupati. 40 cm x 63 cm. 2024.
Ñawera txo
Ñawera vê
Ñawera greka ï ah
Ñawera mostra para mim
Potl'ika prika ansehon ey txemim
As raízes de meu povo
Ñawera txo
Ñawera vê
Pañike-yuñun kahira day uxo tatak
Nosso umbigo no coração de nosso território
Ñawera greka
Ñawera mostra
Krim yamoeni ure tigagika xamum
O sangue que corre como a serpente
Krim yamoeni he metl'onma tigagika pañike-yuñun
Xapeprera prika potl'ikama day axe
O sangue que é forte como nossos pés enraizados sobre a terra
NHEÉ A'E PYA ARTE
PETE Ī GWYRÁ Ū'Ū
Djatsy Motara, 2000
Ilustração digital em papel fotográfico fosco.
48x58 cm. 2023.
BAOBÁS
Julia Duarte, 2001
Ilustração digital em papel fotográfico fosco.
55x73,33 cm. 2023.
Ancestralidade y afeto se encontram
na curva do medo de seguir caminhando
tem lugares que cheguei e só sobrevivi
por ter encontrado afeto no caminho.
e tem encontros que a gente vive que são ancestrais.
ancestralidade y afeto se encontram
na curva do medo de seguir caminhando.
aí acalantam.
vi gente que sem ter coragem, me encorajou.
sem reconhecimento, me reconheceu.
sem ter abraço, me abraçou.
a maioria gente que sem receber afeto, me afetou, e nem sabe.
assim eu descobri que afeto é abraço quente
que se recebe sem pretensão.
KANOAS FLUTUANTES
Anabya, 1999
Espatódea, galho de árvore e barbantes.
1,09 m x altura variável. 2023.
kanoas flutuantes
em memória ao rio amazonas-furo do afuá
flutuando no rio
o curumim remava na sua kanoakasa
o tempo parou pra ele passar.
mainha me banhava
hipnotizada
e como quem me chama pro fundo
eu tão pequena, afundei, afoguei
acho que o rio queria dar esse tempo a ela
aquele silêncio
alguns segundos
que ela pôde descansar o maternar,
naquele curumim que deslizava sua kanoa,
como quem flutua, como peixe numa nave
ela admirando, percebeu meu silêncio
o rio tem seus segredos.
me puxou de volta!
que susto mãe.
eu tenho na memória a visão do fundo,
a cor e temperatura, tenho no cabeça, o banho
daquele rio
Um movimento espontâneo e bonito foi a presença orgânica de textos literários — narrativas, poemas, fragmentos de memória — acompanhando as obras, conferindo densidade poética e epistêmica à experiência expositiva, manifestando o vínculo profundo entre artistas e suas obras. Desse modo, a exposição se constituiu como um processo de criação mútua.